A disputa em 2018 também inclui a narrativa politica

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Publicado Segunda, 30 de Abril de 2018 às 06:47, por: CdB

A linguagem da política permite identificar o tipo de visão de mundo do interlocutor, tanto do ponto de vista político, se situado à direita ou à esquerdo do espectro político, quanto do ponto de vista ideológico, se liberal ou socialista

Por Antônio Augusto de Queiroz - de Brasília:

Se perguntarem a alguém à esquerda do espectro político sobre as visões de estado em disputa no pleito de 2018, essa pessoa dirá que existem três projetos em jogo: a) o estado de bem-estar social, b) o estado liberal-fiscal, e c) o estado penal.

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A disputa em 2018 também inclui a narrativa politica

Se for feita a mesma pergunta a alguém à direito do espectro político, essa pessoa dirá também que existem três visões em disputa: a) uma populista, com soluções fáceis para problemas difíceis, b) outra pautada pela razoabilidade, com reformas e equilíbrio fiscal; e c) uma linha dura ou de defesa ordem.

Disputa

Nessa disputa também existem articulistas, que estão tão identificados com as forças liberais e fiscais; que chegam a dizer que qualquer alternativa de sucessão fora da continuidade do projeto atual, ou seja; fora daquilo que chama do “centro” político, representa ruptura, numa clara indução no sentido da preservação desse modelo.

É nesse contexto em que a disputa política se dará e, portanto, analisar o sentido das palavras e os; que elas representam de desejo e compromisso com determinadas ideias é fundamental, inclusive para saber; que interesses representa o interlocutor ou articulista.

Além da disputa de narrativa, é também preciso se preocupar; e numa escala ainda maior, com o que se convencionou chamar de pós-verdade; que é uma forma de abordagem que prioriza o julgamento moral em detrimento do debate das ideias; dos programas, dos conteúdos, enfim, da racionalidade.

Regra

Como regra, quem adota esse tipo de abordagem não tem como sustentar como legitimas ou éticas as ideias que professa; até porque busca obter apoio das potenciais vítimas de sua implementação; num processo de manipulação da real manifestação de vontade de cidadãos.

Esse processo consiste em buscar despertar nas pessoas as reações, os sentimentos e os comportamentos mais primitivos do ser humano; como forma de evitar o debate às claras dos conteúdos.

Tipo de abordagem

Nesse tipo de abordagem, a racionalidade, a verdade, o debate de conteúdo; nada disso interessa. O que importa é dividir as pessoas; interditar o debate e provocar reações e sentimentos de rejeição ou até de ódio aos agentes políticos e instituições que defendem ideias e propostas; em favor das minorias marginalizadas ou mais vulneráveis social; econômica e politicamente na relação com o estado e o mercado.

A forma de fazê-lo é sofisticada. Emprega-se uma estratégia de comunicação; que consiste em associar pessoas, movimentos; partidos ou instituições que defendem os interesses coletivos, a solidariedade; a justiça, o humanismo, a proteção dos mais necessitados, com práticas que agridem a fé; os valores, os costumes e a moral de milhões de brasileiros.

Debate

Trata-se de tática ardilosa, que interdita o debate ao substituir o exame do conteúdo do tema pelo julgamento moral; pela contestação, pela desqualificação, pela condenação, criando um ambiente propicio à formação de exércitos de fundamentalistas; que utilizam as redes sociais para espalhar boatos, mentiras; notícias falsas e não checadas contra as pessoas que pensam diferente delas.

Notícias

Isso é mais preocupante, ainda, porque o volume de informações que se recebe diariamente; a especialização das notícias, a forma de divulgação por blocos ou cadernos que não guardam coerência entre si; facilitam essa estratégia, porque é praticamente impossível processar essa avalanche de “notícias” sem um método, que permita identificar o que é verdade do que é manipulação.

Um exemplo pode melhor ilustrar o que se afirmar.

Virou moda no Brasil criar-se portais com o objetivo de avaliar os parlamentares; geralmente dentro dessa lógica de desqualificar os; que defendem os interesses coletivos e valorizar os que defendem o neoliberalismo ou a agenda do mercado financeiro.

Ético-moral

A ideia consiste em criar critérios, inclusive de natureza ético-moral; para avaliar como bons apenas aqueles que defendem o receituário neoliberal e a visão moralista justiceira; e desqualificar ou avaliar negativamente todos aqueles que defendem pautas sociais, coletivas ou humanistas.

Para disfarçar os critérios de avaliação parlamentar; que atribuem maior pontuação negativa para tudo que contrarie o interesse do mercado e pontuação menor ou mesmo negativa para os demais itens da avaliação; constituem conselhos; geralmente integrados por acadêmicos ou executivos de empresas com formação liberal ortodoxa e fundamentalista do ponto de vista fiscal; para analisar e julgar o voto dos parlamentares em relação ao mérito das políticas públicas.

Ruralista

Com esses critérios, líderes fundamentalistas da bancada ruralista; que chegam ao ponto de defender o trabalho escravo, aparecem como os melhores parlamentares, enquanto parlamentares como o senador Paulo Paim; cuja trajetória se confunde com a defesa dos mais vulneráveis, aparecem entre os piores.

A divulgação do resultado desses “rankings”, é óbvio, omite deliberadamente, o que efetivamente leva a que Fulano; conservador; seja um “melhor” parlamentar do que Beltrano, de esquerda.

O que importa, em tempos de pós-verdade, é o rótulo que lhes é atribuído, por uma entidade que; em princípio, nem mesmo tem uma identidade política; mas apenas uma “marca”, como se fosse um sabonete ou pasta de dentes.

Por tudo isto, todo cuidado é pouco nestas eleições. O eleitor precisa ficar atento ao significado da linguagem política, necessita não apenas escolher bem seus candidatos, como também selecionar bem suas fontes de consulta e participar do processo do modo consciente e construtivo.

Antônio Augusto de Queiroz, é ornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap.

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