Decisão do STF é chave para a delação de Palocci

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Publicado Sábado, 24 de Junho de 2017 às 11:55, por: CdB

Não apenas delações ou acordos de delação pendentes, como o do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, podem comprometer vários políticos.

 

Por Gilberto Menezes Côrtes  - do Rio de Janeiro

 

Se o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmar, na próxima semana, o entendimento — até aqui da maioria de sete dos 11 membros da Corte Suprema — de que os termos da delação premiada, ou acordos de leniência, são válidos a partir da aprovação da Procuradoria Geral da República (PGR), ou do relator do caso no STF (só cabendo revisão no julgamento final do processo, em Plenário ou numa das turmas), será dada a senha para desengavetar uma série de casos. Aqueles que prometem grande impacto na política e nos meios empresariais, cujos interesses foram tão imbricados nos últimos 15 anos.

palocci-abr.jpgPalocci negocia uma delação premiada junto à Justiça, no âmbito da
Operação Lava Jato

Não apenas delações ou acordos de delação pendentes, como o do ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil de Lula e Dilma, Antonio Palocci, podem comprometer vários políticos, como Luiz Inácio Lula da Silva, Michel Temer, Dilma Rousseff, Aécio Neves, senadores, deputados e governadores. Será também dada segurança jurídica aos novos acordos de leniência de empresas e instituições financeiras. Estas incluídas em recente regulamentação, pela Medida Provisória 784, editada no começo de junho.

J&F e PGR

Há casos que extravasam as relações das estatais, como Petrobras, Eletrobrás, BB, Caixa e Correios, e chegam a órgãos como o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), onde uma lista original apontava mais de 70 grandes empresas. Entre elas, Gerdau, CSN, Suzano, RBS, Ambev, Cervejaria Petrópolis, e grandes bancos (Bradesco, Itaú, Santander, Safra e BTG-Pactual). Todos incursos em irregularidades; sem falar nas empreiteiras e suas controladas. Palocci tem a chave de muitos desses casos, na sua origem.

Nesta sexta-feira, confirmando que as expectativas de que o desfecho do julgamento do acordo da J&F com a PGR, sob a chancela do ministro Edson Fachin, possa acelerar tramitações engavetadas, o Banco Central fechou acordo com a força-tarefa da operação Lava-Jato para que haja coordenação com o Ministério Público Federal em casos que envolvam a apuração simultânea de ilícitos administrativos e penais. Ou seja, diante do impacto que uma investigação em um banco ou instituição financeira (corretora ou banco de investimento) tem na sociedade — muito acima de qualquer impacto numa grande ou mega empresa do setor produtivo —, os representantes do Banco Central estarão à frente da coordenação da operação.

Preocupado com o impacto na solidez do mercado com as prometidas denúncias de Palocci, os procuradores e alguns diretores responsáveis, no BC, pela fiscalização do mercado financeiro e a higidez das instituições financeiras acertaram com procuradores da Operação Lava Jato a apresentação de uma emenda à atual redação da MP 874. A MP eleva as multas que podem ser aplicadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central (BC) de R$ 500 mil para R$ 500 milhões; além de permitir a assinatura de acordos de leniência pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o ‘Conselhinho do BC’.

Carne Fraca

A MP, com os acordos de leniência, facilita tanto ao BC quanto à CVM, regulador do mercado de capitais, descobrir ilícitos que, pela fiscalização normal, não entrariam no radar das duas autarquias. A MP eleva a multa máxima do BC a bancos e instituições financeiras a até 0,5% da receita de serviços e de produtos financeiros. Com limite até R$ 2 bilhões.

Com a coordenação decidida hoje no encontro promovido pelo Banco Central, obtém-se um mínimo de garantias contra riscos sistêmicos que afetam o mercado financeiro quando uma instituição de médio ou grande porte é alvo de boatos sobre sua solidez financeira ou responsável por ilícitos.

Trata-se de medida preventiva para evitar estragos como os da Operação Carne Fraca, que amplificou problemas pontuais nos processos de fiscalização sobre o abate de bovinos, suínos e aves; bem como na fabricação e industrialização de embutidos de carne, que ainda afetam a imagem das carnes brasileiras mundo afora. Esta semana o Brasil foi alvo de denúncias sanitárias da Europa e dos EUA, que suspenderam as importações de carne fresca bovina made in Brasil.

Acordos de leniência

Antes da edição da MP, a CVM podia assinar os chamados Termos de Compromisso, nos quais os investigados se comprometiam a interromper ilícitos, colaborando com as investigações, em troca do pagamento de uma multa mais baixa que a esperada se o caso fosse a julgamento pela diretoria colegiada. No caso do Banco Central, a preocupação com a solidez do mercado levava a intervenções brancas ou à rápida procura pela troca de controle de instituições.

Foi assim no governo Lula, com a compra de 49% do Banco PanAmericano pela CaixaPar, em fins de 2009. Uma operação pouco transparente (descobriu-se depois um rombo gigantesco no Banco Pan, vindo o controle da instituição a ser transferido no ano seguinte ao BTG-Pactual). Esse é um dos imbróglios que poderá ser delatado por Palocci.

A decisão do STF sobre acordos de leniência da Lava Jato também é muito importante, porque tais acordos podem entrar em conflito com a Lei 12.843/2013. A conhecida Lei Anticorrupção. Acordos de leniência são aqueles em que uma empresa e seus dirigentes colaboram com o processo de investigação criminal. Fornecem informações sobre outros suspeitos e ajuda a reparar os danos que causou. Em troca, os órgãos públicos competentes oferecem benefícios, como a redução de penas.

'Enforcement'

A Lei Anticorrupção prevê que o dinheiro a ser ressarcido pelos empresários deve ser negociado em processo à parte ao da responsabilização criminal. Em muitos casos, o Ministério Público Federal (MPF) tem assumido ambas as funções – responsabilização e definição dos valores. Sem a participação da Controladoria-Geral da União (CGU), atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle. Pela lei, a CGU é que deveria celebrar os acordos de leniência relacionados ao Poder Executivo federal.

A palavra-chave para a MP é: 'enforcement'; (a capacidade de investigar e punir, o que é um diferencial para um órgão supervisor de conduta. Com respostas ágeis e seguras). Com o acordo de leniência, será possível obter informações. Mas somente fará acordo quem forneça informação desconhecida do BC ou CVM. E que ajudem a chegar ao final do ilícito.

O 'enforcement' também acaba com o efeito suspensivo necessário contra decisões de 1º grau da CVM. Com a MP, os recursos contra a decisão da CVM serão devolutivos, retornando os autos à segunda instância, o CRSFN. Mas já tem eficácia na 1ª instância. O efeito suspensivo será dado conforme decisão do relator.

O diretor-relator e o Colegiado da CVM terão de enxergar o interesse público desse efeito. Mais do que o efeito privado. As decisões do regulador têm efeito imediato, como regra. Isso representa agilidade na aplicação da sanção. No passado, o efeito suspensivo aliado à demora do CRSFN em julgar prejudicava a efetividade da sanção. As decisões, agora, serão mais efetivas. O que é um grande avanço. E vai preocupar participantes de mercado que não observam as regras da CVM, como os irmãos Batista.

O velho Proer

No caso dos bancos, como são empresas que concentram aplicações e depósitos de milhões de clientes, pessoas físicas e jurídicas, em volumes que excedem em 20 ou 30 vezes o patrimônio, o Banco Central está procurando resguardar a higidez de qualquer instituição que entre na linha de tiro. Estes e suas ramificações no mercado; (pelas interligações e eventuais conchavos no mercado interbancário e nos mercados de derivativos de títulos, câmbio e valores mobiliários).

Quem não se recorda que, antes da instituição do Proer (novembro de 1995), a intervenção no Banco Econômico, em 2 de outubro de 1995, causou um grande trauma no país. Em especial, na Bahia (à parte os interesses de acionista do então senador ACM). O banco era o de maior penetração na vida econômica do Estado.

A partir das garantias do Proer, os dirigentes foram responsabilizados. Os recursos de terceiros, liberados (com o suporte do Fundo Garantidor de Créditos, cujos limites de cobertura foram ampliados). Evitaram-se impactos mais graves no lado real da economia.

A decisão do STF sobre a delação dos dirigentes do grupo J&F (JBS, Vigor, Banco Original, Eldorado Celulose e Alpargatas, entre outras), como se vê, não determinará apenas se o presidente Temer será investigado no Supremo por suspeita de corrupção passiva, obstrução da Justiça e organização criminosa, conforme denúncia a ser apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Gilberto Menezes Côrtes é jornalista.

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