Discurssos sobre a violência

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Publicado Sexta, 15 de Abril de 2016 às 09:29, por: CdB

A violência que sempre existiu foi e é a violência do Estado, que exerce o seu poder para praticá-la na forma da lei

Por Maria Fernanda Arruda - do Rio de Janeiro:
A partir da eleição presidencial de 2014, o Brasil experimenta um processo de violência crescente, quando as ideias foram e estão sendo substituídas pela agressão, de início verbal, mas agora também física. Onde encontrar o brasileiro estereotipado, o "homem cordial"? Desde logo cabe a pergunta: não será mais correto falar sobre as violências? São muitas, provenientes de diversas fontes, provocadas por muitas situações, que atingem indivíduos diversos, vivendo situações diversas, mas que hoje se embaralham e se confundem nos espaços públicos. Mas elas têm a mesma razão de ser. A violência que sempre existiu foi e é a violência do Estado, que exerce o seu poder para praticá-la na forma da lei. Não será nem mesmo cabível dissertar sobre a violência policial nas ruas, onde se massacram os jovens negros e pobres, e nem sobre o que os muros de presídios e penitenciárias não podem mais esconder. Essa é a violência que se expressa como problema social e não é monopólio de nenhuma facção política. As polícias militares,no Rio de Janeiro, em São Paulo e na Bahia, equiparam-se na violência.
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Maria Fernanda Arruda Membros das "famiglias" senhoras do petróleo não aparecem nas páginas dos jornais ou nas mesas-redondas da televisão
Ao Estado servem as Forças Armadas. As missões que a Constituição lhes outorga pressupõem a existência do 'inimigo", a quem só mesmo se poderá oferecer a violência máxima: a guerra de destruição. E não seja esquecido que, durante mais de duas décadas, com base na doutrina do "inimigo interno", elas serviram às elites, dispondo-se a matar brasileiros. Como torturadores e assassinos não foram julgados, os crimes cometidos ontem são estímulo aos que se praticam agora. Alguma dúvida quanto a esse elo de ligação? A ideologia da violência, que se permite que seja discursada no Parlamento, não aponta apenas para o Capitão Bolsonaro. Ele visita a Academia das Agulhas Negras e é aplaudido, integrando-se no ambiente de violência militar. E, se a exclusão de uma voz como essa tem sido impossível, muito mais impossível é a tarefa, entretanto urgente, de arejamento das academias militares. Reconheçamos. Nem todos pensarão assim. Os "protestos" de 2013, enaltecidos por vários estudiosos dos movimentos sociais, foram o prenúncio a essa prática como protesto, admitido, até mesmo quando não sabido contra quem ou o que. Os meios de informação trataram de transmitir o diagnóstico que lhes mais convinha: protesto contra a ausência de representação. De quem? De um Governo eleito livremente pelo povo. Frases feitas e ensinadas pela Rede Globo de Televisão foram repetidas em gritos, embora não soubessem os gritantes o que significavam. O "movimento pelo passe livre", insinuando-se com um tema muito importante, morreu, tal como nasceu, vindo e ido para o vácuo. A destruição de agências bancárias e de estações de metrô terão sido expressões anarquistas, mas, sob essa forma arcaica, também políticas? À época, a violência foi praticada pelos manifestantes, agredindo instalações; e pela polícia militar, contra as pessoas. Os protestos contra o governo Dilma Rousseff, partir de 2014, foram organizados de forma muito mais clara e objetiva, despejando pela ruas a ignorância brutal de uma classe-média branca, analfabeta funcional e dotada de uma inconsciência política que permitiu desfilar-se numa pose de pornografia barata. A proteção das polícias militares, uniformes por todo o País, garantiram a ordem e a expressão livre dos despensamentos. Os radicalismos passavam então a ser transbordados em momentos singulares, na perseguição agressiva aos que se atrevessem a usar a cor vermelha, nos trajes ou na ideologia. Não se trata de esquecer aqui sobre o dogmatismo de gente que se alinha ao PT e defende a Presidenta, permitindo-se também momentos de intransigência violenta. Mas seria omissão inspirada em má-fé não distinguir momentos excepcionais de uma violência reiterada dos que se fizeram a linha-de-frente da intolerância fascista. Essa forma extrema de intolerância, que não admite a controvérsia, não difere, na sua animalidade, daquela que já se praticava nas "arenas" do futebol, onde foram deixando de ser excepcionais os espancamentos dos rivais que se transformavam em inimigos mortais. Por que caminhos, dos estádios ela se transferiu para uma praça de guerra política? Admitamos: a violência da tortura e do assassinato, de pessoas, de instituições e de leis, foi herdada dos tempos de ditadura e foi assimilada a uma "cultura" nacional. Instrumento para isso? Os meios de informação, a imprensa e especialmente a televisão. Com quem eles trabalharam e trabalham? Não apenas com filmes e programas de "jornalismo policial". A violência hoje é praticada por políticos, na suas falas e nas suas ações, uma experiência feita no passado em momentos excepcionais, mas que se difundiu como peste a partir da figura de Aécio Neves. Foi ele quem associou o discurso agressivo e ofensivo a atos de rebeldia criminosa, negando-se à aceitação da expressão de vontade do povo. Hoje, muitas figuras públicas, somando-se a elas,os pastores do neo pentecostalismo, trazem em si a violência que, em primeiro lugar, nega as verdades mais evidentes. Permitindo-nos o que parece raciocínio simplório, vale entretanto lembrar que nas arenas do futebol a violência está assentada nas chamadas "torcidas uniformizadas", ela não é espontânea, mas é estimulada e orientada. Nas arenas da política também existem as "torcidas uniformizadas". A que elas servem? Se chegamos até aqui, a resposta surge pronta: a violência, que nega o diálogo e o debate políticos, serve aos sempre senhores do poder, e esses não estão encastelados apenas nas "casas grandes". Vale lembrar que os arrogantes senhores de engenho eram subsidiados por capitais estrangeiros, no caso os comerciantes holandeses?
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Os governos eleitos democraticamente contrariam uma ordem secularmente estabelecida, resumível no mandonismo dos coronéis modernizados, sustentando os luxos e riquezas, distribuídos à farta entre os que se acomodam em seus gabinetes parlamentares, nos ministérios, nas togas que se transformam em símbolo de excelência. Como eles se sustentam? Eles são amparados, não mais pelo capital vindo de Amsterdan, mas por aquele que, mesmo depois de globalizado, ainda está concentrado nos Estados Unidos. Ao lembrar-se disso, tenhamos cautela. Podemos lembrar de 1964 e perguntar: eles voltaram? Mas não nos esqueçamos de que não há mais nenhuma "guerra fria" a justificar a intervenção violenta de mariners na América Latina. O que há é a "guerra dos grandes interesses econômicos", onde são predominante os da Máfia do Petróleo. Desnecessários comentários mais longos: todos nós assistimos "O Poderoso Chefão". E a Máfia do Petróleo tem uma estória que vem se desdobrando por décadas e décadas, vivida em tantas partes do mundo. Por que não na América Latina, aquela que fica abaixo da Linha do Equador e onde não se pode pecar; não há pecado aqui? Até mesmo membros da Maçonaria estão dispostos a abandonar seus segredos, desfilando em defesa dos privilégios, fazendo-se "rodadores de bolsinha" nas avenidas. Mas não os membros das "famiglias" senhoras do petróleo. Eles não aparecem nas páginas dos jornais ou nas mesas-redondas da televisão. A discrição marca as suas ações. Quando o presidente da Shell visita o Brasil, a imprensa noticia em linguagem quase cifrada: "O presidente da Shell, Ben van Beurden, posicionou a Petrobras como prioridade entre os investimentos globais da empresa. Em coletiva de imprensa para falar sobre a fusão com a BG, o executivo afirmou que o país está entre os três mais importantes onde investe. Em seguida, posicionou o Brasil como o "mais importante em nossa carteira". Existem os procuradores defensores de seus interesses: o sombrio Jose Serra confabula com Renan Calheiros e faz uso de um Jucá, que assusta a um Governo desgovernado. Os governos do PT, com Lula e depois com Dilma, provocaram temores e rancores. Mas não se praticou contra eles a violência, não se pretendeu negar o Estado de Direito. Isso passou a acontecer a partir do momento em que se definiram as regras para a exploração do petróleo do pré-sal. Se não eram regras de rigoroso nacionalismo, não entregavam tudo, e a Máfia do Petróleo quer tudo. Dilma Rousseff cedeu(ou teve que) demais da conta, com uma política econômica digna do PSDB de FHC e de Gustavo Franco. Mas relutou na entrega do pré-sal. Jucá foi à sua busca e o entregou nas mãos de Jose Serra. Hoje. o Governo rexiste e precisa sobreviver, para que se cumpra a Constituição e para que a Democracia sobreviva.
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