Especialistas dizem que transposição para Cantareira não encerra crise da água

Arquivado em:
Publicado Sexta, 07 de Novembro de 2014 às 07:50, por: CdB
cantareiraagua1.jpg
Além de não resolver problema de SP, transferência de água da bacia do rio Paraíba do Sul para sistema paulista pode afetar abastecimento no RJ
A transposição de água da bacia do rio Paraíba do Sul para o Sistema Cantareira pode amenizar, mas não dar fim à crise da água no estado de São Paulo. Segundo especialistas ouvidos pela à agência alemã de notícias Deutsche Welle (DW) , além de não solucionar a escassez nos reservatórios paulistas, a medida poderia prejudicar o abastecimento na região metropolitana do Rio de Janeiro. A proposta foi apresentada em março pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Nesta quarta-feira (05/11), o presidente da Agência Nacional de Águas (ANA), Vicente Andreu, sinalizou que a transposição é "tecnicamente viável". - Tudo é possível, mas tem um custo. As autoridades erram ao não fazerem um estudo técnico antes de tomarem uma decisão política - critica o oceanógrafo David Zee, professor da Uerj. A bacia do rio Paraíba do Sul banha os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. De acordo com a proposta de Alckmin, o rio Atibainha, que fica no Sistema Cantareira, receberia água do reservatório do rio Jaguari, que é um dos afluentes do Paraíba do Sul. - Uma retirada adicional de água trará impactos que serão sentidos com mais força quando houver escassez de chuva diz Paulo Carneiro, pesquisador do Laboratório de Hidrologia da Coppe/UFRJ. "A segurança hídrica deve diminuir, e a frequência de períodos de seca na bacia, aumentar." O especialista em recursos hídricos Antônio Carlos Zuffo não acredita que a transposição irá resolver a crise hídrica em São Paulo. O volume do Cantareira continuará descendo, mesmo que em menor intensidade. - A cada dia, o nível do reservatório fica mais baixo. Enquanto entram em torno de 9,63 metros cúbicos de água por segundo, são retirados 22,5 (metros cúbicos) para o Alto Tietê e o consórcio PCJ, que abastece algumas cidades do interior paulista. A defasagem é grande - diz Zuffo. O nível do sistema Alto Tietê e da represa Guarapiranga também diminuiu de forma drástica. Como os reservatórios do sudeste e do centro-oeste estão com volume muito baixo, se chover pouco até o fim deste ano, é possível que haja um racionamento de energia, alerta Zuffo. Interesses em jogo A transposição da bacia do Paraíba do Sul envolve impasses jurídicos, administrativos e econômicos. Carneiro afirma que o argumento de que a medida vai aumentar a segurança hídrica é falso. Para o especialista, a pressa da ANA e do governo de São Paulo em fazer a transposição é questionável. O projeto, que é complexo e exige uma série de etapas preparatórias, seria executado num período mínimo de três anos. - Isso só mostra que houve de fato uma incompetência no planejamento de longo prazo. Não dá para querer sangrar o Paraíba do Sul sem trazer o assunto para o debate amplo, sem colocar as cartas na mesa - diz Carneiro. "São Paulo sabia há mais de duas décadas que era necessário fazer investimentos para evitar uma crise de abastecimento." Além das obras, a transposição exigiria resolver entraves jurídicos. O reservatório Jaguari foi construído pela Companhia Elétrica de São Paulo (Cesp) para a geração de eletricidade. Segundo Zuffo, para fazer a transposição, a ANA precisa fazer outra outorga junto ao Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), para que o reservatório também seja destinado ao abastecimento urbano. - A Cesp terá de ser indenizada, porque a retirada de água vai reduzir o rendimento da usina hidrelétrica. A amortização do investimento feito na construção não será cumprida no período previsto - afirma. Em nível territorial, o gerenciamento de recursos hídricos no Brasil é dividido por bacias hidrográficas. Apesar de estar em São Paulo, a bacia do Paraíba do Sul é federal e de responsabilidade da ANA. O domínio da bacia, no entanto, é do estado de São Paulo. - Há uma sobreposição de legislações. Esse imbróglio jurídico precisa ser resolvido, por isso, está no Supremo (Tribunal Federal (STF) - diz. O ministro Luiz Fux, do STF, convocou uma audiência de mediação para que o tema seja debatido entre o governo federal, agências reguladoras, Ministério Público Federal e representantes dos estados. Fux negou um pedido de liminar da Procuradoria Geral da República para impedir a transposição. Ainda estão em jogo os interesses do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, já que a bacia do Paraíba do Sul abastece várias cidades nos dois estados. O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, declarou que, se a União decidir transferir água do Paraíba do Sul para o Sistema Cantareira, ele irá acatar.
Tags:
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo