O que queremos do SUS

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Publicado Sábado, 09 de Julho de 2016 às 10:03, por: CdB

Portanto, a luta a ser travada não passa pelo desinteresse, pela estigmatização do SUS e sim pela sua valorização. Seria um retrocesso abrirmos mão de um sistema universal

  Por Oscar Berro - do Rio de Janeiro:   De algum tempo para cá o Sistema Único de Saúde, conhecido como SUS, vem sendo atacado por um “vírus” sorrateiro, capaz de, a longo prazo, levar à sua morte. Esse “vírus” é a crescente percepção de que o Sistema “é para os pobres”, não sendo adequado para quem pode buscar atendimento na rede privada. Este é um terrível engano, com graves conseqüências para a saúde pública. Desprezar um Sistema dos mais avançados do mundo, disponível, literalmente, a todos, é abrir mão de uma excelente estratégia de saúde, capaz de, ao contrário da rede privada, prover atendimento para todas as possíveis ocorrências médicas, a qualquer ser humano que delas necessite, independente do CEP, da faixa de renda.
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O grande calcanhar de Aquiles do SUS é a sua incapacidade de atender à enorme demanda
A imagem distorcida da qualidade do atendimento prestado, presente entre os não usuários do Sistema, leva a uma segregação, a uma previsão auto-realizável, ou seja, quanto mais o desprezamos, menores os investimentos, menor a qualidade. Pergunte a você mesmo, leitor, de onde vem a sua opinião a respeito. Pergunte depois a quem, de fato, o utiliza. A grande maioria dos profissionais médicos de ponta dedica parte de seu tempo a algum Hospital Público. Lá, sem dúvida, você irá encontrar “medalhões” atendendo da mesma forma que atendem nos Hospitais mais caros. Claro que há deficiências. O grande calcanhar de Aquiles do SUS é a sua incapacidade de atender à enorme demanda, levando a um tempo de espera além do aceitável. Entretanto, quanto mais o desprezamos, mais atuamos na contramão da melhoria. E aí cabe perguntarmos a quem interessa a propagação deste “vírus”. A resposta óbvia será na direção dos Planos de Saúde, beneficiários diretos de um preconceito sem sentido contra o SUS. Os elogios dirigidos à medicina no exterior não levam em conta o seu custo, o enorme abismo entre quem pode e quem não pode pagar. É o império dos planos privados, com o Estado deixando de lado, ao contrário do que ocorre no Brasil, o interesse em oferecer saúde a todos seus cidadãos. Contudo, a grave crise financeira vivida pelo país está empurrando para o SUS uma grande parcela da classe média, expulsa do que considera o paraíso. A chegada desses novos usuários, curiosamente, pode vir a ser, por vias indiretas, uma vacina contra o citado “vírus”, pois a crescente pressão pela melhoria do Sistema, feita por um tipo de usuário com mais voz ativa, levará, forçosamente, à diminuição dos prazos de espera, como já dito, inaceitáveis. Portanto, a luta a ser travada não passa pelo desinteresse, pela estigmatização do SUS e sim pela sua valorização. Seria um retrocesso abrirmos mão de um sistema universal. É preciso, ainda, lembrarmos que o SUS é mais do que costumamos pensar. Ele é também Vigilância Sanitária, qualidade de alimentos e remédios, vigilância contra doenças emergentes. Muitos alegam a falta de recursos do Estado para investir na saúde, como se isto fosse uma verdade absoluta. Como sempre, isto é, simplesmente, uma questão de prioridade. Mas, certamente, isto é também uma questão das pressões que a sociedade está disposta a exercer para que suas prioridades sejam as do Estado. Alguns alegam que uma boa saúde pública inviabilizaria a existência de uma rede privada. Mas essa seria uma decorrência de mercado, alheia aos interesses dos cidadãos. As perguntas a serem feitas são por que virarmos o nariz para um Sistema com tantas vantagens? Por que desistirmos dele sem nem ao menos tentar? Por que pagar muito caro pelo que está à nossa disposição? Por que deixar esse “vírus” se propagar, “matando” um paciente, o SUS, que ainda tem tanta coisa a dar à sociedade brasileira. Por que insistirmos em não ver? Por que?   Oscar Berro, é sanitarista da Fundação Oswaldo Cruz.
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