Publicado Quinta, 26 de Maio de 2016 às 15:04, por: CdB
Por Maria Lúcia Dahl, do Rio de Janeiro: O momento de reflexão de uma avó
Há quantos anos que eu não virava dona de casa, o que, de certa maneira, sempre fui, só que saía sempre pra trabalhar e não parava em casa fazendo filmes, peças e novelas que me levavam pelo Brasil afora, onde nossa equipe era imediatamente acolhida por grupos cujos componentes viravam nossos amigos para sempre, cheios de assuntos objetivos e ideais semelhantes.
Como podemos viver nesse país de agora, soltos no espaço, com os políticos roubando, mentindo e ensinando ao povo brasileiro todos os absurdos pra se ganhar dinheiro e se lixar para o próximo? Quem é o próximo hoje em dia? O que espera na fila de um banco ou de um supermercado, o gerente gritar: “o próximo”?
Passo o dia esperando o pedreiro que some de repente e o encontro alguns dias depois enchendo a cara num botequim com o dinheiro que lhe paguei pra consertar os azulejos e ele me diz que teve zika e que ficou esperando que algum hospital cuidasse dele, a faxineira que também não aparece por que diz pelo telefone, à cobrar, que pegou dengue e está esperando na fila da emergência, depois de eu ter pagar a sua diária. O pintor de parede que some dizendo que acabou com o mofo do quarto de fora e os buracos da parede, que dou uma olhada e vejo que está tudo igual.
Também me transformei em avó que se preocupa o dia inteiro com os netos , um que mora em Los Angeles, e fico sem notícias dele, outro que mora em S. Paulo e vem ficar aqui em casa no computador me fazendo obrigá-lo a comer, tentar fazê-lo estudar, me fazer um carinho. Nada!
Será que a vida sempre foi assim quando chega uma certa idade? Não pode haver um trabalho interessante pra um grupo que se una em torno de um ideal , como fazíamos antigamente, em vez de ficar todo mundo selfie olhando pro celular, pouco se lixando pro destino do país?
Não me lembro da minha avó se preocupar um minuto comigo nem com minha irmã, cada uma com sua babá,( que jamais faltaram o trabalho), estudando, enquanto vovó fazia roupas na máquina, bordava e se divertia com as amigas fofocando sobre as outras, na varanda lá de casa, jogando cartas e se reunindo em grupos.
E eu que não costuro, não bordo, não gosto de celular, não conheço nenhum grupo que seja políticamente idealista e chamativo, que não tenho trabalho, faço o que da vida alem de me preocupar com os netos e os assaltos?
Graças a Deus fui assistir um filme interessante, que também há anos não via, que se chama ”Juventude” e é sobre idosos. Maravilhoso ver , finalmente , uma obra brilhante,feita atualmente, o que nos dá uma ligeira folga da TV que tem nos levado á loucura nesse” país que acreditávamos ser “ do futuro” , percebendo, agora que chegamos à ele, que essa foi uma piada de português inventada por algum político que tentou adiar um governo honesto já no ano de 1500...A saída, onde fica a saída?
Maria Lúcia Dahl, atriz, escritora e roteirista. Participou de mais de 50 filmes entre os quais – Macunaima, Menino de Engenho, Gente Fina é outra Coisa – 29 peças teatrais destacando-se- Se Correr o Bicho pega se ficar o bicho come – Trair e coçar é só começar- O Avarento. Na televisão trabalhou na Rede Globo em cerca de 29 novelas entre as quais – Dancing Days – Anos Dourados – Gabriela e recentemente em – Aquele Beijo. Como cronista escreveu durante 26 anos no Jornal do Brasil e algum tempo no Estado de São Paulo. Escreveu 5 livros sendo 2 de crônicas – O Quebra Cabeça e a Bailarina Agradece-, um romance, Alem da arrebentação, a biografia de Antonio Bivar e a sua autobiografia,- Quem não ouve o seu papai um dia balança e cai. Como redatora escreveu para o Chico Anisio Show.Como roteirista fez recentemente o filme – Vendo ou Alugo – vencedor de mais de 20 premios em festivais no Brasil.Direto da Redação, editado pelo jornalistaRui Martins.
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