A polêmica em torno do artigo que Dilma escreveu para a Folha

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Publicado Sábado, 02 de Janeiro de 2016 às 15:42, por: CdB

Os que defendem o artigo de Dilma na Folha usam também, essencialmente, o mesmo modelo mental obsoleto. Eles dizem que é uma maneira de Dilma se comunicar com analfabetos políticos

Por Paulo Nogueira - de Londres
A primeira treta de 2016 já está no ar. No centro está um artigo que Dilma escreveu para a Folha a propósito do Ano Novo. A questão é: Dilma apanhou tanto da Folha, e é assim que ela responde?
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Dilma frita ovo na Globo, com Ana Maria Braga; escreve artigo de fim de ano na Folha e vira capa da Veja. Depois reclama que há um golpe em curso
Para mim, trata-se de um modelo mental obsoleto. Dilma enxerga a mídia ao velho modo – jornais e revistas impressos, rádios e televisão. A internet, nesta ótica, é uma coisa exótica e para poucos. Os que defendem o artigo na Folha usam também, essencialmente, o mesmo modelo mental obsoleto. Eles dizem que é uma maneira de Dilma se comunicar com analfabetos políticos, ou reacionários, ou, como muitos definem, “coxinhas”. Não é um bom argumento. Quantas pessoas leem a Folha? Destas, quantos lerão Dilma? E quantos se deixarão convencer por qualquer coisa que venha dela? Faça um exercício: leia os comentários no site sobre o texto. Do ponto de vista da simbologia, além de tudo, a mensagem não poderia ser pior: fraqueza e pusilanimidade diante do inimigo. Dilma não se ajuda com o artigo na Folha. Ajuda, com certeza, a Folha, em seu marketing cínico de pluralidade.

É por esta mesma lógica que os dois governos do PT veem enfiando bilhões de reais, ano após ano, em empresas jornalísticas dedicadas a destruí-los

Não é fácil para ninguém se libertar de velhos modelos mentais. No PT, um raro exemplo de libertação veio de Lula. Em 2015, Lula passou a tratar a mídia como ela o trata. Ou quase, uma vez que Lula não é inescrupuloso como os donos das corporações jornalísticas. Mas ele disse um claro basta depois de apanhar calado durante tanto tempo. Deixou de dar entrevistas, por exemplo, aos jornais. A internet permite a ele dizer o que quer do modo que quer. Em seu Instituto Lula ele coloca suas opiniões com frequência. Elas acabam repercutindo na mídia tradicional, nas redes sociais e nos sites progressistas. Lula encontrou seu jeito, na Era Digital, de se comunicar. Descobriu que não tem que se ajoelhar e pedir espaço para jornais e revistas que o abominam. Lula deu também entrevistas coletivas não a jornalistas da Folha, Globo, Veja – mas a blogueiros. É um bom hábito que ele deveria manter em 2016. Igualmente neste caso, a mídia tradicional acabou cobrindo, indiretamente, Lula. Em sua reinvenção no trato da mídia, Lula deu outro grande passo. Deixou de ser passivo diante de calúnias e acusações sem fundamento. Passou a dar seu lado prontamente via instituto e, em muitos casos, acionou a Justiça. Hoje, quem quiser acusar Lula das costumeiras barbaridades vai pensar duas vezes, ou três. Ainda que a Justiça seja de um modo geral favorável à mídia e desfavorável a Lula, ser processado dá trabalho e custa dinheiro. Em situações normais, a relação entre figuras públicas e a imprensa segue outro caminho, mais cordial. Mas estamos brutalmente distantes de uma situação normal. Lula se deu conta disso. Dilma não. Paulo Nogueira é jornalista, fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.
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