A camada pobre da população brasileira vive imersa em uma crise de direitos humanos cada vez mais profunda, na qual são comuns assassinatos cometidos por policiais, prisões superlotadas e esquadrões da morte agindo com impunidade, afirmou o grupo Anistia Internacional na sexta-feira.
A secretária-geral da Anistia, Irene Khan, em declarações dadas ao final de sua missão no Brasil, desafiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a cumprir suas promessas de promover o respeito aos direitos humanos.
– Observamos uma crise cada vez mais grave. Descobrimos que há dois Brasis. Um que defende os direitos humanos e um que os fere com impunidade -, afirmou Khan em uma entrevista coletiva.
As violações e os abusos cometidos por policiais aumentaram neste ano. De janeiro a setembro, a polícia matou 664 civis em São Paulo, segundo dados oficiais. No Rio de Janeiro, essa cifra foi de 917 pessoas mortas, mais que três vezes o número registrado em 2000.
– Muitos dessas mortes são criminosas e muitas das vítimas eram pessoas inocentes -, disse Khan.
O Brasil apresenta altos índices de violência, um problema agravado pela grande distância que separa os ricos dos pobres.
A polícia diz matar para se defender ou porque os suspeitos reagem à ordem de prisão. Tudo em um contexto no qual, também segundo a polícia, agem criminosos e traficantes de drogas cada vez mais bem armados e mais audaciosos.
Postos da polícia em São Paulo foram atacados neste mês em uma ação coordenada e realizada por criminosos. No Rio, as favelas são controladas por grupos de traficantes.
Segundo Khan, a Anistia reconhecia que policiais também eram vítimas dos criminosos. Mas isso, disse a secretária-geral, não era uma desculpa para o desrespeito aos direitos humanos.
O Brasil desenvolveu um sistema judicial de duas faces, no qual os ricos são protegidos e os pobres, reprimidos, afirmou.
– Comunidades carentes inteiras estão sendo vitimadas. Elas são alvos da polícia e vivem sob medo constante. Os pobres transformaram-se no bode expiatório de problemas resultantes de um longo abandono das políticas sociais e de um fracasso disseminado dos sistemas públicos de segurança -, disse Khan.
A Anistia também chamou atenção para a ação de assassinos de aluguel em áreas nas quais atuam sem-terra ou ativistas das causas indígenas.
As condições de vida nas prisões superlotadas eram horríveis, afirmou Khan. A tortura nas delegacias e nas prisões tornou-se endêmica e o principal método de investigação.
“Acabar com a exclusão econômica e scoial, especialmente a fome, é um passo vital rumo à superação das vastas desigualdades que são a raiz da maioria das violações a direitos humanos no Brasil.”