O conluio da ultradireita norte-americana com o nepotismo de Bolsonaro

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Publicado Quinta, 25 de Julho de 2019 às 06:52, por: CdB

O nepotismo exacerbado do Bolsonaro indicando seu filho Eduardo, o 03, para embaixador em Washington, é um problema grave, acentuado pelo enorme despreparo do 03 para o cargo. Mas a rumorosa indicação é um projeto da ultradireita americana para garantir a submissão da América do Sul aos desígnios do seu país, reduzindo esse subcontinente ao que foi em tempos passados, um quintal dos Estados Unidos.

Por Haroldo Lima - de São Paulo

Na História do Brasil, sempre foi marcante e insolente a ingerência dos Estados Unidos. Quando governos nacionais tiveram postura de independência, como os de Getúlio, Jango, Lula e Dilma, o Império encontrava jeitos de torpedear seus planos, sabotá-los e até derrubá-los.
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Além de ato de nepotismo vergonhoso e afrontoso, a indicação de Eduardo Bolsonaro é uma manobra urdida pela ultradireita norte-americana
O golpe de 1964 foi o exemplo maior. Um porta-aviões de propulsão nuclear, o Forrestal, foi deslocado para a costa brasileira com tropas americanas prontas para desembarcar, caso houvesse resistência ao golpe. Se, entretanto, um governo acata os ditames imperiais, se o presidente bate continência até para funcionário subalterno dos norte-americanos, se seu ministro das Relações Exteriores em seis meses transforma o Itamaraty em acessório secundário da política dos Estados Unidos, então o Império manda, desmanda, faz festa, humilha. É o que está acontecendo agora no governo servil e aloprado do capitão reformado. O último gesto acanalhado da súcia que comanda hoje a política externa brasileira foi o de não abastecer navios iranianos fundeados em portos brasileiros, que carregavam milho brasileiro a ser exportado. Só para bajular os americanos. Uma vergonha.

Eduardo Bolsonaro

É nesse contexto que se sobreleva a propalada indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Ela é um ato de nepotismo vergonhoso e afrontoso do governo de Bolsonaro, mas não só isso, é também uma manobra urdida pela ultradireita norte-americana, que poderá ter graves consequências para nosso país e a América do Sul. As digitais de Steve Bannon estão na origem da artimanha. Steve Bannon é um destacado prócer da extrema direita americana. Ex-banqueiro, dirigiu um site de notícias chamado Breitbart News, descrito por ele como “a plataforma da alt-right”, direita alternativa. A revista Time disse que o Breitbart News "instilava material racista, sexista, xenofóbico e antissemita na veia da direita alternativa" (Time 18/11/2016). Bannon afastou-se do Breitbart para assumir, em 2016, a diretoria-executiva da campanha presidencial de Trump. Em janeiro de 2017, fundou com o belga Mischaël Modrikamen uma organização a que chamam de The Moviment, destinada a respaldar e promover grupos direitistas.

Cargo

Eleito Trump, Steve Bannon ocupou cargo de primeiro escalão na Casa Branca, como estrategista de Trump, até abril de 2017, quando foi defenestrado por desentendimentos pessoais com o presidente, ao que consta. A partir de meados de 2018, o ex-estrategista de Trump circula pela Europa articulando partidos nacionalistas e populistas de direita para o The Movement e incorpora no grupo um destacado direitista italiano, Matteo Salvini, o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, a italiana Giorgia Meloni, líder do grupo fascista Irmãos da Itália, o holandês Geert Wilders, a conhecida direitista francesa Marine Le Pen e outros. A organização planeja ter um escritório em Bruxelas, sede da União Europeia, e Bannon declarou à Bloomberg que a proposta do The Moviment está crescendo e atingirá “outros continentes”. A campanha presidencial no Brasil estava em curso, quando, em 4 de agosto de 2018, Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL de São Paulo, encontrou-se em Nova York com Steve Bannon. O Twitter do Eduardo exibiu no mesmo dia sua foto com o Steve, dizendo que tiveram “uma grande conversa”, verificaram ter a “mesma visão do mundo” e uniram-se no desejo de “somar forças, especialmente contra o marxismo cultural”. Eduardo emprega aqui a expressão “marxismo cultural”, cunhada pela extrema-direita americana a partir de ideias originalmente expostas por Adolf Hitler, no seu Mein Kampf. Eduardo informou ainda, na mesma ocasião, que Bannon deliberou ajudar a campanha de seu pai, em “atividades de inteligência, ações na Internet e análise de dados”. (Wikipédia) A campanha de Bolsonaro notabilizou-se pelo uso abusivo de “fake news”. Talvez seja a partir desse momento que Rubens Ricúpero, ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos e ex-ministro da Fazenda, registra que Eduardo Bolsonaro passou a dirigir “na América do Sul o movimento de extrema-direita de Steve Bannon”. Dito movimento, observa Ricúpero, é “uma seita de extremistas que os americanos chamam de lunatic fringe” (franja lunática, ou borda lunática, em tradução livre) (UOL, 18/07/2019).

Embaixada em Washington

A propalada indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada em Washington é tida, ademais, como patrocinada também pelo empresário Clifford Sobel, ex-embaixador dos Estados Unidos no Brasil, no Brasil de 2006 a 2009, durante o governo de George W. Bush. Sobel é próximo ao presidente Donald Trump e ao assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton (Estadão, 12/07/2019).

Diplomacia

Foi com entusiasmo que Steve Bannon saudou a eventual indicação de Eduardo para o posto mais importante da diplomacia brasileira no exterior, vendo nisso oportunidade de crescimento do The Moviment, apesar de Eduardo ter de “provavelmente” deixar a chefia do grupo na América do Sul, porque “o cargo de embaixador vai lhe tomar 100% do tempo" (CP, Porto Alegre). Assim, tem inteira procedência a indagação do velho diplomata de carreira Ricúpero: “Como poderia ele (Eduardo) representar todos os brasileiros se é o representante de uma seita?". Contudo, a ideia de representar todos os brasileiros não é a preocupação do presidente. Ele pensa que o embaixador representa a sua pessoa, não a Nação. “Pretendo beneficiar um filho meu, sim. Pretendo, está certo. Se puder dar um filé mignon ao meu filho, eu dou” (FSP 18/07/2019). A indicação do embaixador para Washington tem ainda um caminho a percorrer. Passará por uma sabatina e duas votações secretas no Senado. Pressões e campanhas devem ser feitas intensamente para impedir que a direita norte-americana, mancomunada com o desejo nepotista do presidente dar um filé mignon ao seu filho 03, ponha como embaixador do Brasil nos Estados Unidos o chefe para a América do Sul de uma sua seita reacionária. Será uma grande vitória para o Brasil. Haroldo Lima, é engenheiro, foi deputado federal (PCdoB-BA) e diretor geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). É membro da Comissão Política Nacional do PCdoB.

As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil

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