Só se… Só se a reconversão do presidente Bolsonaro ao Centrão repercutir mal na expansão do evangelismo que, há alguns meses, se previa como capaz de ultrapassar, os 50% da população brasileira.
Porém, na hipótese de prosseguir a evangelização brasileira, nos moldes estadunidenses, não serão mais possíveis, por ofenderem a Deus, os grandes sucessos carnavalescos populares irreverentes como o capcioso Mamãe eu quero mamar, cantado por Carmen Miranda, em 1950, e o irreverente Eva me leva pro paraíso agora, de Haroldo Lobo, desrespeitoso com a história bíblica de Eva no Paraíso.
Esses dois sucessos seriam colocados no index, e ficaríamos com aquela dúvida — se Deus existisse seria um cara sério demais, sem jogo de cintura?
Seria assim, tipo tristeza não tem fim? Como dizia Vinicius de Moraes, a felicidade do pobre parece a grande ilusão do Carnaval. Mesmo assim, A Felicidade, esse grande poema seria condenado ao ostracismo por não falar no amor de Deus e pecar por citar o Carnaval.
Nessa destruição iconoclasta da nossa cultura musical, não escapariam nem aqueles versos poéticos pungentes do Humberto Teixeira quando a lama virou pedra e mandacaru secou, contando o drama dos retirantes da seca nordestina, na voz do Luiz Gonzaga. Assim como Asa branca.
Muito menos as canções da boemia, como a do apaixonado pela mulher do cabaré, Quem há de dizer, cantada pelo rei da voz, como era conhecido Chico Alves.
Mas a música popular brasileira, tem sido de resistência — Chico Buarque com Construção, Geraldo Vandré com Caminhando, Gilberto Gil com Procissão, Caetano Veloso cantando É proibido proibir. Com uma pausa romântica de Roberto Carlos, da jovem guarda, buzinando seu Calhambeque em plena ditadura militar.
E há as músicas da bossa nova, como Chega de saudade, de João Gilberto, e Garota de Ipanema, de Tom Jobim.
Existem ainda as canções bregas, a música sertaneja, Tom Jobim, Jair Rodrigues, Nara Leão, Elis Regina, Raul Seixas, Marisa Monte, a Legião Urbana (com Que país é este) e Cazuza e tantos outros cantores, compositores, condenados ao ostracismo musical para dar lugar aos gospels.
Será mesmo? Não acredito! A inspiração brasileira é mais forte e mais livre.