Escola não é lugar de polícia

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Publicado Segunda, 27 de Setembro de 2021 às 06:59, por: CdB

 

O projeto de autoria do deputado bolsonarista Coronel Sandro (PSL), representa um retrocesso para a educação pública estadual, pois permite a transformação de algumas escolas estaduais em escolas cívico-militares, sem os devidos estudos de impactos financeiros e pedagógicos que a iniciativa traria para o sistema educacional como um todo em um cenário de pós pandemia.

Por Wadson Ribeiro - de Brasília

A Assembleia Legislativa de Minas aprovou, essa semana, na Comissão de Constituição e Justiça, projeto que autoriza o Estado a criar uma versão mineira do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares.
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O Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares estão na esteira de uma onda conservadora que está estacionada sobre o Brasil
O projeto de autoria do deputado bolsonarista Coronel Sandro (PSL), representa um retrocesso para a educação pública estadual, pois permite a transformação de algumas escolas estaduais em escolas cívico-militares, sem os devidos estudos de impactos financeiros e pedagógicos que a iniciativa traria para o sistema educacional como um todo em um cenário de pós pandemia. O ministério da Educação pretende implantar até 2022 cerca 216 escolas cívicos-militares em todo o território nacional. O modelo pretende ser um misto entre as escolas militares tradicionais e as escolas públicas comuns. Em tese toda a elaboração dos conteúdos pedagógicos ficaria a cargo de civis e a parte administrativa e disciplinar seriam responsabilidade de militares, numa parceria entre as secretarias de Educação e de Segurança pública nos Estados. O argumento oficial do governo é que essas escolas tornam o ambiente mais seguro e os resultados aferidos na qualidade do ensino são melhores. Contudo, a proposta vem no sentido de moldar a formação de nossos jovens com os valores e a visão de mundo daqueles que combatem a educação laica. É claro que os resultados aferidos pelas escolas militares ou cívico-militares são superiores aos resultados obtidos pela maioria das escolas públicas e isso é fácil de entender. Se o estudante da escola pública convencional custa ao estado 6 mil reais por ano, o das escolas cívico-militares custam 19 mil reais. Hoje no Brasil há 68 mil escolas com o ensino Fundamental 2 e Ensino Médio. Se em cada uma dessas instituições o custo por aluno fosse o mesmo que o das escolas cívico-militares, tenho certeza que a qualidade das escolas públicas seriam bem melhores. Resta saber se esse modelo é viável do ponto de vista de seu custeio para o conjunto do sistema, se é uma política universal ou ilhas ideológicas para formarem um futuro exército de bolsonaristas.

Modelo elitista

Além dessas contradições, esse modelo é elitista porque, ao contrário das escolas públicas, exclui os jovens de baixa renda e que se encontram em situações de vulnerabilidade social e não reúnem condições de acesso a essas instituições sem um sistema diferenciado de ingresso, como as cotas sociais. Os defensores desse modelo sempre se orgulham de um padrão de excelência e de valores positivos que essas escolas propagam. Será que esses valores são laicos a ponto de formarem cidadãos com capacidade crítica? Ou continuarão defendendo a tese de que no Brasil nunca houve golpe militar, que a escravidão foi boa para os negros, que os índios não foram mortos e torturados por exploradores nem por militares torturadores? Será que nessas escolas os direitos humanos serão respeitados e seus valores difundidos ou os jovens homossexuais serão vítimas de homofobia? Na verdade, o projeto que tramita na Assembleia de Minas e o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares estão na esteira de uma onda conservadora que está estacionada sobre o Brasil e dialoga diretamente com os variados projetos que tratam da famigerada proposta de “escola sem partido”. A pretexto de combater uma suposta ideologização de esquerda nas escolas, a partir de 2015, vários projetos foram apresentados na Câmara Federal, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras Municipais brasileiras, com o intuito de combater a liberdade de expressão e de cátedra no interior das escolas, sobrepondo, assim, uma visão obscura e anticientífica, calcada em valores religiosos, dogmáticos, preconceituosos, a uma educação verdadeiramente laica, plural, crítica e emancipadora. Precisamos de nossas forças de segurança e de nossos militares nas ruas combatendo o crime e não dentro das escolas cerceando a liberdade de estudantes e de professores. Esse governo é inimigo da educação porque não quer cidadãos cultos, críticos e conscientes politicamente. Somente aprofundando a ignorância é que se perpetua um governo genocida como esse. Queremos mais Paulo Freire e menos polícia, uma escola que se pinte de todas as cores, plural, laica e emancipadora.

Wadson Ribeiro, é presidente do PCdoB-MG, foi presidente da UNE, da UJS e secretário de Estado.

As opiniões aqui expostas não representam necessariamente a opinião do Correio do Brasil

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