A novela FIFA-CBF continua sendo acompanhada com grande interesse pelos brasileiros, sobretudo pelos que curtem futebol.
Não é de hoje que são divulgadas denúncias sobre propinas pagas a cartolas. Só que antes nenhum dirigente foi pego, até a prisão na Suíça do ex-presidente da CBF José Maria Marin.
Este cartola tem um passado comprometedor, não só no que diz respeito às suas ligações com o futebol, como também como parlamentar vinculada à ditadura que oprimiu o Brasil por 21 anos.
Marin, por sinal, começou sua carreira como vereador do partido integralista liderado pelo famigerado Plínio (Anaué) Salgado, apoiador do nazifascismo na II Guerra Mundial.
Depois, Marin transferiu-se com malas e bagagens para o partido criado para apoiar a ditadura, a ARENA.
Como deputado estadual por São Paulo, Marin elogiava o delegado Sergio Fleury, um dos maiores torturadores que o país já conheceu.
Como se não bastasse, Marin em um dos seus pronunciamentos pediu rigor contra o que considerava “infiltração comunista” na TV Cultura, onde era editor o jornalista Vladimir Herzog.
Nos anais da Assembleia Legislativa de São Paulo encontram-se os discursos de Marin, que ao pedir rigor das autoridades na TV Cultura na prática também foi responsável pela prisão de Herzog, que resultou no assassinato do jornalista, fato reconhecido oficialmente pelo Estado brasileiro.
Marin voltou-se para o futebol tornando-se um cartola que com o tempo enriqueceu até chegar à presidência da CBF em substituição ao não menos corrupto Ricardo Teixeira, que ocupou o lugar de João Havelange.
Nesta história toda, a Rede Globo não pode ser esquecida, porque pelo menos desde a Copa do Mundo de 70 conseguiu as maiores facilidades para a transmissão de partidas internacionais e nacionais de futebol.
Nas nacionais, a Rede Globo chegou ao ponto de impor horários, depois das novelas, para o início das partidas, o que afastou dos estádios quem trabalha e tem de acordar cedo no dia seguinte.
Na novela FIFA-CBF destaca-se a figura do empresário J. Hawilla, que tem vínculos profundos com o esquema Globo. Hawilla em determinado momento, no início de sua carreira de picaretagens, chegou a ser diretor esportivo da emissora da família Marinho em São Paulo. Transformou-se em empresário presidindo a Traffic, uma fortaleza do marketing esportivo.
Ele foi pego em flagrante delito nos Estados Unidos e acabou acertando a devolução de milhões de dólares obtidos com propinas.
Mas quem imagina que o esquema de envolvimento da Rede Globo com cartolas para em J. Awilla engana-se, porque tem mais jogadas.
O discurso do diretor de Esportes da Rede Globo, em São Paulo, Marcelo Campos Pinto, na festa de encerramento do campeonato paulista de 2015, tira qualquer dúvida a respeito dos fatos relacionados com o escândalo da FIFA e o envolvimento da emissora, também conhecida como Vênus Platinada.
Marcelo Campos Pinto, entre outras coisas, colocou José Maria Marin nas alturas, algumas semanas antes da prisão do cartola na Suíça.
Em um dos trechos do seu discurso, Campos Pinto destacou: “Presidente Marin, em nome do grupo Globo, em meu nome, eu gostaria de agradecer todo o carinho, toda a atenção com a qual o senhor sempre nos brindou, sempre aberto a discutir os temas que interessam ao futebol brasileiro, dos quais me permito destacar, o novo formato da Copa do Brasil, que deu mais charme a essa competição promovida pela CBF, que é a verdadeira competição do futebol brasileiro”.
Referindo-se ainda ao poderoso chefão, o diretor da Globo disse que “a sua visão de homem do futebol fez com que a CBF passasse a patrocinar essas competições e melhorasse o nosso futebol. A Granja Comary, toda reformada, para a formação de nossos futuros craques. E por que não dizer da sede da CBF, a José Maria Marin? Presidente, o senhor inscreveu o seu nome na história do futebol, tendo sucedido um grande presidente, que foi Ricardo Teixeira”.
Pois é, em uma só cajadada, Campos Pinto encheu a bola de Marin e Ricardo Teixeira e claro não fez isso à toa. Ou será que alguém duvida?
O que teria a dizer agora depois da prisão de Marin o todo poderoso global Marcelo Campos Pinto? Ficaria em silêncio, repetiria o que disse ou mudaria de assunto rapidinho?
Por estas e muitas outras que ainda não são de domínio público, qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito que se preze deverá também vasculhar tudo, não poupando a Rede Globo, que está metida até a raiz em questões de transmissões de partidas de futebol e denúncias graves sobre sonegação fiscal.
Volta e meia, depois da prisão de Marin, o noticiário da Rede Globo destaca que as empresas que transmitem partidas das seleções mundiais de futebol nos mais diversos quadrantes não estão envolvidas no esquema de corrupção da FIFA.
A CPI aberta por empenho do Senador Romário vai ter que ir fundo nestas e em outras questões referentes ao mais popular esporte no Brasil e no mundo. Se ficar na pirotecnia, nada resolverá de concreto.
Não tem sentido mais o futebol ficar entregue aos caprichos de figuras como José Maria Marin, Marco Polo Del Nero, atual presidente da CBF, o tal que voltou rapidinho ao Brasil depois da prisão de Marin na Suíça, entre outros.
Agora, a Polícia Federal investiga também Ricardo Teixeira. As denúncias são antigas e remontam a gestão de João Havelange, que Teixeira sucedeu por indicação do próprio poderoso chefão de então. Teixeira por sinal era genro de Havelange.
Só depois de dissecar tudo isso o futebol poderá retornar às suas raízes, afastando do espectro os tais cartolas que enriqueceram na base de comissões indevidas. Eram até pouco tempo cidadãos acima de qualquer suspeita, apesar das denúncias divulgadas em vários espaços.
Passar a limpo o esquema dos cartolas será um grande desafio.
Mário Augusto Jakobskind, jornalista e escritor, correspondente do jornal uruguaio Brecha; membro do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (TvBrasil). Seus livros mais recentes: Líbia – Barrados na Fronteira; Cuba, Apesar do Bloqueio e Parla , lançado no Rio de Janeiro.
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