Uma maré humana passou diante do corpo do papa João Paulo II na terça-feira, numa vigília que terá seu auge na sexta-feira, no maior funeral da história da Igreja Católica.
Separados da multidão, os cardeais que comandam temporariamente a Igreja se reuniram pelo segundo dia para discutir os complicados ritos fúnebres e a posterior eleição do sucessor.
Diante da Basílica de São Pedro a fila é longa, e lá dentro o corpo do papa, em vestes vermelhas, está exposto, tão visível e popular quanto era em vida.
O Vaticano disse que 18 mil pessoas passam por hora diante do esquife. Entre segunda e terça-feira, já são 1 milhão de fiéis, e outros 600 mil devem comparecer na quarta-feira.
“É uma bonita experiência estar aqui e ver quanta gente veio testemunhar o passamento deste grande papa”, disse Caterina Avantagiato, 21, que mora no sul da Itália e passou a noite em um trem para chegar a Roma.
Os cardeais decidiram que a basílica ficará aberta até a noite de terça-feira, quando o corpo do papa será retirado do esquife e colocado em um caixão cúbico de cipreste, já para o funeral de sexta-feira.
Os ritos fúnebres vão durar três horas e contarão com a presença de reis, presidentes e primeiros-ministros, reunidos por um instante para homenagear o líder religioso mais conhecido do mundo.
Além disso, 2 milhões de fiéis devem comparecer à cerimônia, numa homenagem sem precedentes ao homem que ajudou a derrubar a Cortina de Ferro, viajou pelo mundo difundindo sua mensagem e afastou alguns católicos por causa de sua ortodoxia.
Em meio à avalanche de homenagens, algumas vozes dissonantes se ergueram, acusando o falecido papa de destruir a democracia na Igreja e de se distanciar de muitos fiéis devido a seus rígidos valores morais.
“As políticas internas do papa polonês foram devastadoras”, disse o mais conhecido teólogo dissidente do mundo, Hans Kueng.
CONCLAVE
O porta-voz do Vaticano, Joaquín Navarro-Valls, disse que 91 dos 183 cardeais da Igreja se reuniram no Vaticano na terça-feira. Só os cardeais com menos de 80 anos, que são 117, poderão participar do conclave secreto, cuja data ainda não foi marcada — seu início é previsto para entre 15 e 20 dias após a morte do pontífice.
Muitos já se referem a Wojtyla como “João Paulo, o Grande”, em reconhecimento a um pontificado que fez dele uma das figuras mais importantes do século passado.
Mas tanta louvação irrita alguns, especialmente na França, onde críticos acusaram o governo de atropelar a tradicional divisão entre Igreja e Estado ao decretar luto pela morte do papa. “Há cinco dias há uma hagiografia sobre o pontífice soberano, sem qualquer espírito crítico”, disse o senador socialista Jean-Luc Melenchon.
É o tipo de comentário que não pode ser ouvido nas ruas lotadas ao redor do Vaticano, onde a multidão continua se dirigindo à Praça de São Pedro, levando bandeiras, cruzes, fotos de João Paulo II e sombrinhas.
As autoridades locais enviaram mensagens aos celulares na região do Vaticano alertando sobre o calor durante o dia, o frio à noite e as longas filas. “Está fora de controle. Mas todos estão pacientes, então está bom, é uma multidão muito pacífica”, disse um policial.
Preparando-se para o afluxo inédito de peregrinos e governantes, Roma está adotando medidas de segurança que incluem baterias antiaéreas e uma zona de exclusão aérea sobre a cidade a partir de quinta-feira.
Entre os presidentes com presença confirmada estão personalidades tão díspares quanto o norte-americano George W. Bush e seus inimigos Bashar Al Assad, da Síria, e Mohammad Khatami, do Irã. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também participará do enterro.
Uma ausência notada será a do turco Mehmet Ali Agca, que cometeu um atentado contra o papa em 1981 e foi posteriormente perdoado por ele. As autoridades turcas rejeitaram um pedido para que ele fosse libertado