"Que os 'tempos estranhos' não cheguem à organização do Tribunal", resume o ministro, após afirmar que fazia o registro "com cópia aos colegas" do Supremo. Em 31 de maio, o escritório Teixeira Zanin Martins encaminhou petição ao gabinete de Marco Aurélio.
Por Redação - de Brasília
Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o jurista Marco Aurélio Mello denunciou, nesta sexta-feira, que uma petição dos advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, dirigida a ele, foi "interceptada" antes de chegar a seu gabinete. A correspondência, segundo Mello, foi encaminhada diretamente ao presidente da Corte, Luiz Fux. Segundo Marco Aurélio, um pedido feito pelos defensores do petista não "mereceu dinâmica própria".
"Desde sempre, a Secretaria Judiciária encaminha petição ao destinatário. Ocorre que a peça em anexo, dos impetrantes Cristiano Zanin Martins e outros [advogados de Lula], alusiva a habeas corpus tendo como paciente o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, datada de 31 de maio do corrente ano, a mim endereçada, não mereceu a dinâmica própria. Veio a ser 'interceptada' e encaminhada, diretamente, à Presidência, ao gabinete de Vossa Excelência", escreveu Marco Aurélio Mello, em ofício.
"Que os 'tempos estranhos' não cheguem à organização do Tribunal", resume o ministro, após afirmar que fazia o registro "com cópia aos colegas" do Supremo. Em 31 de maio, o escritório Teixeira Zanin Martins encaminhou petição a Marco Aurélio pedindo que ele oficiasse ao ministro Fux para que o presidente do Supremo pautasse o processo de suspeição do ex-juiz Sergio Moro no caso do tríplex.
Sorteio
O magistrado, que pediu vista do processo, já havia devolvido o caso para julgamento há mais de um mês. Mas Fux não havia ainda determinado data para a retomada do debate —que acabou posteriormente marcado para a próxima quarta-feira. A atuação de Fux tem contrariado ministros da Corte, que consideram que ele tenta interferir em processos de outros gabinetes. O presidente do Supremo afirma que seguiu critérios "legais e regimentais".
Marco Aurelio citou um outro exemplo, no qual o presidente da Corte estaria interceptando ações relacionadas à covid-19 que deveriam ser julgadas pelo ministro Ricardo Lewandowski e determinando que sejam redistribuídas a outros gabinetes. Lewandowski fora sorteado para a primeira ação sobre o tema, portanto, todas as demais matérias semelhantes deveriam ser encaminhadas ao seu gabinete.
Não é o que tem ocorrido, segundo Mello.
A questão da Copa América, por exemplo, a ação movida pelo PT questionando o torneio ficou com o ministro. Mas outras duas, movidas pelo PSB e pela Confederação dos Trabalhadores, foram encaminhadas para sorteio. E a relatoria do caso coube à ministra Cármen Lúcia. A questão da competência dividiu o tribunal: por 6 a 5, a maioria não conheceu do pedido do PT entendendo que o partido não poderia ter direcionado a ação a Lewandowski.
‘Capitã cloroquina’
Num outro exemplo, Fux encaminhou para sorteio o pedido de governadores para que não depusessem na CPI. No entendimento de magistrados da Corte, a ação deveria ficar com Lewandowski. Ele já tinha sido sorteado anteriormente para julgar o pedido do general e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que queria ter o direito de ficar em silêncio na CPI.
Mas o caso dos governadores foi sorteado e caiu com a ministra Rosa Weber. Os novos pedidos, como o do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), a partir daí foram encaminhados à magistrada. Na quarta-feira, a ministra decidiu que ele não precisaria comparecer à comissão.
Fux fez o mesmo com o pedido da secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mayra Pinheiro, a ‘capitã cloroquina’. O pedido de habeas corpus feito por ela para ficar em silêncio na CPI foi enviado para sorteio pelo presidente do STF e caiu com o ministro Gilmar Mendes, que levou em consideração o fato de Lewandowski ser o prevento na análise do tema e devolveu o processo. O processo foi reencaminhado a Lewandowski.
Resposta
Em nota, o presidente do STF negou que tenha interceptado petição direcionada ao ministro Marco Aurélio. Segundo disse, as petições protocoladas eletronicamente são direcionadas aos relatores dos processos — no caso de Lula, ao ministro Edson Fachin. Por isso ela não teria tramitado na Presidência. Ele diz que conversou com o colega e que tudo "foi esclarecido".
Sobre os processos de Ricardo Lewandowski, ele afirma que "não existe prevenção para a pandemia" e que "segue as regras de distribuição ou eventual prevenção com base em critérios técnicos, legais e regimentais, sem dar preferências ou privilégios a qualquer parte de processos".