Após emigração da África para a Europa, população desenvolveu gene que a tornou mais resistente a baixas temperaturas, mas mais suscetível a enxaquecas, aponta estudo. Doença é mais comum em climas mais frios
Por Redação, com DW – de Berlim:
Estima-se que cerca de um bilhão de pessoas em todo o mundo sofram regularmente de ataques de enxaqueca. Na Alemanha, cerca de 1 milhão de pessoas são afetadas todos os dias, enquanto nos Estados Unidos cerca de 13% dos adultos dizem que sofrem regularmente de fortes dores de cabeça.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os ataques de enxaqueca são a sexta doença mais incapacitante do mundo. Além de uma forte dor latejante que pode durar dias seguidos, os afetados muitas vezes também experimentam distúrbios visuais, náuseas, tonturas e sensibilidade à luz.
Há muito tempo a enxaqueca tem sido vista como uma doença hereditária, transmitida de pais para filhos. No entanto, pesquisadores do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, na cidade alemã de Leipzig, sugerem que o elo pode ser bem mais antigo.
Um estudo realizado por uma equipe liderada pelo cientista Felix-Michael Key, pesquisador em genética evolucionária do Instituto Max Plank, descobriu que uma mutação genética que tem conhecida relação com a enxaqueca é muito mais comum em pessoas da Europa ou descendentes de europeus.
– Queríamos analisar a adaptação humana a diferentes fatores ambientais e queríamos nos concentrar no efeito da temperatura – disse Key, em entrevista à agência alemã de notícias DW.
Ao estudar os padrões genéticos do gene TRPM8, receptor nas células nervosas através do qual os seres humanos sentem as temperaturas frias, Key e sua equipe descobriram que certas mutações eram muito mais frequentes em algumas regiões e latitudes geográficas.
Clima e enxaqueca
Ao fazer uma retrospectiva de dezenas de milhares de anos de dados do genoma, o estudo descobriu que a mutação genética ligada à enxaqueca é mais frequente quanto mais se avança para o norte, em direção a climas mais frios.
Por exemplo, de acordo com as descobertas de Key, apenas cerca de 5% das pessoas com ancestrais nigerianos têm a variação do gene, enquanto 88% das pessoas com ancestrais finlandeses a possuem. A OMS também aponta que o número de pessoas que sofrem de enxaquecas na África e na Ásia é menor do que em outras regiões.
– Normalmente, você observa algo em alguma frequência em uma população em algum lugar e espera que essas frequências sejam as mesmas em todas as populações – afirma Key. “Mas aqui você tem uma mudança de frequência de quase 80%. Isso é algo muito incomum.”
Os dados sugerem, portanto, que quando os primeiros humanos viajaram da África em direção ao norte, eles se ajustaram a temperaturas mais frias, mas ao fazê-lo, também se tornaram mais suscetíveis a enxaquecas.
– A colonização pode ter sido acompanhada de adaptações genéticas que ajudaram os primeiros humanos a lidar com temperaturas mais baixas – afirma a geneticista Aida Andres, da University College London, que supervisionou o estudo.
No entanto, os resultados não esclarecem por que as suscetibilidades a enxaquecas e a temperaturas frias estão geneticamente ligadas. Isso ainda permanece um mistério, de acordo com Key.
– Podemos especular, no entanto, que haja uma sobreposição funcional no receptor que pode mediar enxaquecas, juntamente com a percepção da dor e do frio – explica. “Assim, o resfriamento do receptor provoca efeitos que vão em uma direção similar, mesmo que não estejam diretamente relacionados entre si.”