Delegado paulistano constrange cientista reconhecido, mundialmente, em processo por apologia ao consumo de maconha.
Por Redação - de São Paulo
A exemplo de um período em que foram presos os irmãos Samuel Dias de Oliveira, Luis Carlos Max do Nascimento; Zuleide Aparecida do Nascimento e Ernesto Carlos Dias do Nascimento, com idades entre 2 e 9 anos de idade no momento da prisão, durante a ditadura militar que se desdobrou no golpe de Estado de Maio de 2016; o fascismo no serviço público encontra um novo patamar. Agora, a polícia intima cientistas, sob acusação de apologia ao crime.
O psicofarmacologista Elisaldo Carlini foi intimado a depor, na véspera, à polícia do Estado de São Paulo, acusado de promover o uso de drogas. Trata-se, porém, de um dos mais renomados especialistas em entorpecentes do Brasil. Carlini, com 88 anos, é professor emérito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Diretor do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid). Um dos pioneiros no Brasil na pesquisa sobre o efeito da maconha no organismo humano, tema ao qual se dedica há 50 anos.
Nas décadas de 1970 e 1980, liderou na Unifesp um grupo de pesquisa que, junto a outros estudos internacionais, possibilitou o desenvolvimento de medicamentos à base de Cannabis sativa; utilizados em vários países para tratamento de epilepsia e esclerose múltipla, por exemplo.
Criminoso
Por seu trabalho como pesquisador, foi condecorado duas vezes pela Presidência da República durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Está no sétimo mandato como membro do Expert Advisory Panel on Drug Dependence and Alcohol Problems, da Organização Mundial da Saúde (OMS). É ex-membro do Conselho Internacional de Controle de Narcóticos (INCB), eleito pelo Conselho Econômico Social das Nações Unidas.
Contrário ao uso recreativo da maconha, Carlini é defensor ferrenho da aplicação medicinal da planta.
— Bom, por tudo isso não parece que eu seja um criminoso, né? Mas ontem eu fui prestar declarações à polícia por apologia ao crime. Fiz a declaração, não tenho medo nenhum, mas me dá pena; fico sentido que o Brasil esteja nessa situação. Não sou eu que não mereço, é a ciência brasileira que não merece, porque tem outros que estão em igualdade comigo. É um trabalho seríssimo — disse Carlini, em entrevista ao blog Nocaute, do escritor Fernando Morais.
Carlini, condescendente, disse que não culpa “o delegado e o juiz que fizeram isso, não”.
— Se eu fosse um juiz, um delegado, 100% fiel às leis, e não olhasse o legal e o legítimo, tinha mesmo que me indicar. Mas ninguém mais faz isso. No mundo inteiro, me chamam para fazer conferências (sobre o tema). Na verdade, deve ser alguém de muito mau humor que fez isso — conclui o cientista.