Maioria absoluta do partido votou contra a proposta da presidenta, de chamar um plebiscito se voltar ao Planalto. Na tentativa de minimizar os danos, Falcão disse que “esta iniciativa é do Senado”
Por Redação – de São Paulo
A presidente eleita Dilma Rousseff participou, nesta terça-feira (23), de ato em Defesa da Democracia, em São Paulo. O ato foi organizado pela Frente Brasil Popular e movimento Brasil Sem Medo. A cúpula do PT não esteve presente. Estava reunida na sede do partido, onde decidiram adiar de dezembro deste ano para março de 2017 o Encontro Nacional Extraordinário, no qual deve ser discutida a abreviação do mandato da atual direção da legenda.
A ideia é que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva passasse a comandar, pessoalmente, os destinos da agremiação partidária, mas ainda não há um consenso a respeito. A diretriz tem sido amplamente respaldada pela ala majoritária do partido, a corrente Construindo um Novo Brasil, que deseja a mudança de comando, com a retirada do jornalista Rui Falcão, para evitar um cisma no partido, atualmente pressionado pelo movimento Muda PT, que inclui parcela significativa da bancada no Congresso. Lula acompanha de perto as negociações, mas ainda não teria se decidido.
Enquanto isso, Rui Falcão mantém o veto à proposta da presidenta Dilma, de chamar novas eleições se conseguir retomar o poder, após votação no Senado. Na reunião da Executiva Nacional, na noite passada, por maioria, o PT negou apoio à proposta de um plebiscito. Na tentativa de minimizar os danos, Falcão disse que “esta iniciativa é do Senado”.
— A questão está posta por ela. Ela se dispõe, voltando à Presidência, a propor a convocação de um plebiscito. Cabe ao Senado, por maioria simples, convocar um plebiscito — resumiu.
Reunião significativa
No encontro, que reuniu centenas de pessoas na Casa de Portugal, no Centro de São Paulo, Dilma disse que o golpe em curso no país é “um ataque de parasitas à árvore da democracia”. “Eles assumem lentamente o controle de partes da árvore”, disse. A presidenta também falou da sua decisão de ir ao Senado se defender.
— Eu vou no Senado, porque eu acredito na democracia desse país. Eu devo isso ao povo brasileiro. Temos que evitar esse mal, esse impeachment sem crime de responsabilidade, evitar um mal maior. Vou lá não porque acredito na beleza de meus olhos. Tenho absoluta clareza do que estão fazendo. Sei que é injustiça. Não estou me vitimizando, mas sei que é injustiça quando se condena alguém sem motivo. Não fui obrigada a me suicidar, no fui obrigada a pegar um avião para ir para o Uruguai, porque temos uma democracia que construímos. Minha presença é muito incômoda, extremamente incômoda — afirmou.
Dilma também se ressentiu por não ter participado dos Jogos Olímpicos do Rio.
— Eu e Lula fomos esquecidos. Organizamos os móveis, a casa, e no dia da festa nos proibiram de entrar na festa — disse.
Compareceram à reunião o coordenador da Frente Povo sem Medo e do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos, e o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Ambos fizeram duras críticas ao golpe de Estado, em curso.
— Temer e sua turma de golpistas dizem que, passando o julgamento do Senado, se o golpe for vitorioso, o país vai entrar num período de estabilidade, céu de brigadeiro, paz social. O que queremos dizer é que eles estão brincando com fogo. Se este golpe for vitorioso vai se abrir a porteira de um longo período de instabilidade — assinalou Boulos.
Segundo o professor de Psicologia e líder do MTST, os movimentos que coordena e outros estarão na frente do Senado, no dia 29, durante a votação, “quando a presidente for falar naquele covil, e estaremos fechando várias partes do país. Isso não passa e não passará” .
— O presidente Vargas foi derrotado pelas forças mais atrasadas pela campanha mais sórdida comandada por Carlos Lacerda. Naquele julgamento, Carlos Lacerda ganhou, mas hoje, tantas décadas depois, está no seu lugar, na lata de lixo da historia. E é assim que vão se encontrar os golpistas de hoje daqui a um tempo — disse Boulos.
Haddad afirmou que o que está em jogo no atual momento é “muito mais” do que uma simples troca de pessoas ou coalização no poder. “A presidenta Dilma, que já foi vítima de um golpe quando militava, é vitima agora de outra modalidade de golpe, um golpe institucional contra a Constituição.”
Plebiscito rejeitado
Na sede do PT, a Executiva Nacional rejeitou, por 14 votos a 2, a proposta apresentada pela presidenta Dilma, pela convocação de plebiscito sobre antecipação de eleições no Brasil. Os dirigentes do partido também votaram contra a publicação de um documento que endossaria a sugestão de Dilma, na primeira manifestação pública contrária à proposta. Em recente entrevista ao Correio do Brasil, no entanto, Falcão já havia externado sua contrariedade à proposta de Dilma. A emenda – apresentada pelo secretário de Formação do PT, Carlos Henrique Árabe – reproduzia um trecho da carta de compromissos divulgada por Dilma na tentativa de reverter a tendência pelo impeachment no Senado. E sugeria uma declaração do partido em favor do plebiscito.
“O PT apoia a afirmação da presidenta Dilma na sua carta histórica ao povo: ‘Estou convencida da necessidade e darei meu apoio irrestrito à convocação de um plebiscito, com o objetivo de consultar a população sobre a realização antecipada de eleições, bem como sobre a reforma política e eleitoral'”, dizia o texto que foi rejeitado.
Prevaleceu, no entanto, a avaliação do presidente do PT, de que a promessa de um plebiscito não teria, neste momento, capacidade de atrair senadores contra o impeachment. Apesar do descontentamento de parcela da legenda, Falcão nega que o fato tenha se transformado em uma crise interna. O debate sobre a proposta de Dilma levou os dirigentes a uma discussão em decibéis mais altos. No final das contas, apesar de a defesa à realização do plebiscito ter saído derrotada, o documento retirado do encontro apoia a realização de ato contra o impeachment e classifica o governo de Michel Temer como “usurpador”.
O documento ressalta, ainda, que a realização dos Jogos Olímpicos no Rio foi uma vitória de Lula e Dilma: “As Olimpíadas recém encerradas, cuja realização é uma inegável conquista dos governos Lula e Dilma, mostraram ao mundo um país orgulhoso de si, que não aceita retrocessos e que aprendeu a ocupar seu lugar no mundo”, encerra o texto.