STF suspende demarcação contínua da reserva Raposa Serra do Sol

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Publicado terça-feira, 4 de janeiro de 2005 as 19:42, por: CdB

A homologação da reserva indígena Raposa Serra do Sol se tornou um impasse jurídico que se estende há mais de seis anos no país. Nesta segunda-feira (03), a ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu suspender a portaria do Ministério da Justiça que, em 1998, estabeleceu a demarcação contínua da reserva.

No processo formal de reconhecimento de um território indígena, o primeiro passo é a realização de um estudo antropológico, realizado pela Funai, para delimitar a terra. Depois, esse relatório precisa ser aprovado pelo Ministério da Justiça, o que conclui a demarcação. Somente após essa etapa acontece a homologação.

Até a publicação da portaria, suspensa nesta segunda-feira, foram dez anos de negociações com índios, fazendeiros, moradores e o governo do estado para que a área fosse considerada efetivamente território indígena.

As discussões começaram em 1977, com sucessivos grupos de trabalho monitorados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) responsáveis por esgotar as negociações para a demarcação das terras. Em 1992, foram criados grupos interministeriais para discutir o caso, e somente em 1993 foi publicado no Diário Oficial da União um estudo com o atestado de viabilidade técnica-administrativa para a criação da reserva.

Em 1996, os ocupantes da área fizeram a defesa pública dos interesses contrários e favoráveis à criação da reserva indígena, e somente em 1998 a portaria determinando a demarcação das terras foi publicada. Um ano depois, os fazendeiros que ocupavam as terras já começavam a deixar a reserva. A maioria foi indenizada pela Funai, e alguns agricultores deixaram as terras após negociações com o Conselho Indígena de Roraima (CIR).

Segundo o antropólogo Paulo Santilli, da Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), dos 207 fazendeiros que ocupavam as áreas da reserva em 1999, apenas 67 ainda permaneciam na região em 2003. A demora do governo federal em homologar definitivamente a reserva, segundo o antropólogo, provocou o retorno de muitos agricultores e fazendeiros para a região. “O poder judiciário pensa que o tempo dos índios é eterno”, criticou.

Depois da portaria de 1998, uma ação popular aprovada pela Justiça Federal de Roraima conseguiu anular a demarcação da reserva. Em julho de 2004, o STF derrubou a ação popular e a demarcação voltou a vigorar. Com a nova decisão da ministra Ellen Gracie, que ainda precisa ser aprovada pelo plenário do STF, as terras se tornariam mais uma vez propriedade do governo do estado de Roraima. A decisão de Ellen Gracie foi tomada com base em ação cautelar ajuizada no STF pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PPS-RR), que é contrário à homologação contínua da reserva.

Na avaliação da procuradora da República Débora Duprat, o processo de demarcação das terras já foi concluído em 1998 e não existe questionamento jurídico que justifique o retorno das discussões. “A homologação é só o ato de conferência dos limites (das terras) que já tinham sido estabelecidos na demarcação. Não é o momento de se definir mais limites da área”, criticou a procuradora durante recente seminário realizado na Universidade de Brasília.

Segundo Débora Duprat, que coordena a 6ª Câmara do Ministério Público Federal, responsável pelas causas que envolvem as comunidades indígenas, o direito às terras não pode ser questionado aos índios. Na opinião da procuradora, uma pequena parcela da elite do estado está conseguindo reverter o foco das discussões. “O direito à identidade é de fluição imediata. Não se pode protelar ou ficar ao sabor os interesses da vez”, disse.