Uma outra plataforma de governo

Arquivado em:
Publicado Sexta, 23 de Dezembro de 2016 às 14:18, por: CdB

Incompetência e  corrupção têm impedido a solução dos nossos problemas sociais. A falta de formação política e ideológica dos nossos políticos é um entrave importante para a criação de plataformas de ações de governo capazes de solucionar a desigualdade social e garantir um desenvolvimento sustentável. O governo Lula parecia ter aberto o caminho para opções políticas mais autênticas, porém acabou comprometido pela visão desenvolvimentista de Dilma. Como se poderia corrigir esses desvios? O filósofo gaúcho Moysés Pinto Neto enumera medidas que poderiam  ter provocado um outro rumo nestes últimos seis anos, Nota do Editor.

Por Moysés Pinto Neto, de Porto Alegre:

DIRETO-CONVIDADO23-5-1.jpg
Propostas que poderiam ter salvado o governo petista

Estava aqui pensando em coisas que poderiam integrar uma plataforma que se contrapusesse às tendências atuais do capitalismo, nos seus dois modelos (desenvolvimentismo e neoliberalismo), e cheguei à conclusão que boa parte era viável em 2010, se a continuação do Governo Lula tivesse ido para outro caminho que não o projeto Brasil Maior. A maioria nem dependeria do Congresso. Algumas dessas coisas já estavam nascendo, outras envolveriam ruptura:

a) em vez de empréstimos e estímulos para gigantes da economia, implementar o programa de renda mínima cidadã;

b) em vez de isenções fiscais, aumentar a taxação de carros e financiar transporte público de qualidade (não necessariamente estatal);

c) deixar para a iniciativa privada financiar a infraestrutura, mantendo rígida regulação ambiental e respeitados territórios indígenas e quilombolas;

d) em vez de despejar centenas de milhares de reais em programas sem foco (como o Ciência sem Fronteiras), traçar como meta principal do governo -- sua "bandeira" -- a recuperação da escola pública, inclusive revisando o pacto federativo, se necessário;

e) criar uma regulação baseada no compartilhamento e colaboração para o mundo virtual, permitindo que o Brasil fosse um território livre da tirania do copyright;

f) investir em políticas culturais que valorizem autonomia local, como já eram os Pontos de Cultura, fomentando no Brasil uma nova indústria criativa da bricolagem;

g) criar regulações trabalhistas específicas para micronegócios de empreendedores com menor renda, permitindo uma maior formalização;

h) revisar a matriz produtiva dos alimentos no Brasil, proibindo ou diminuindo drasticamente o uso dos agrotóxicos e substituindo os transgênicos;

i) ambos produtos, de f), g) e h), poderiam receber um selo de qualidade (algo como "Selo Brasil") que significaria produção limpa e comércio justo, colocando-se como contraponto da produção asiática baseada na exploração da mão-de-obra e poluição ambiental;

j) fazer o "Minha Casa Minha Vida" de outra forma totalmente diferente, fomentando financiamento de pequenas cooperativas de construção dos próprios locais e colocando uma matriz de código aberto para que arquitetos e urbanistas pudessem aperfeiçoar a qualidade dos imóveis;

l) cortar instituições públicas sem eficiência que só servem de cabide de emprego para partidos políticos;

m) manter o equilíbrio fiscal e controle da inflação, apostando que os novos experimentos microeconômicos seriam mais efetivos que o velho estatismo desenvolvimentista;

n) propor plebiscito sobre descriminalização das drogas;

o) limpar a matriz energética do país, fazendo com que a Petrobrás se deslocasse nos investimentos para energias solar e eólica, aos poucos abandonando combustíveis fósseis;

p) fazer uma ampla simplificação da parte burocrática do país, colocando o princípio da boa-fé como norte principal da fé público e enfraquecendo os cartórios;

q) propor uma reforma previdenciária com teto único universal, que corte todos os privilégios existentes, com idade menor possível (segundo cálculos atuariais) e seguindo um meta razoável para que a pessoa implemente o valor total;

r) propor uma reforma tributária justa, com especial ênfase na correção da injustiça entre classes e redistribuição federalista dos valores;

s) propor uma reforma política que contemplasse candidaturas independentes e ampliação do espaço da democracia direta;

t) assumir o risco de perder a eleição seguinte.

Moysés Pinto Neto, doutor em Filosofia pela Universidade Católica do Rio Grande do Sul, professor na Faculdade de Direito da Universidade Luterana do Brasil, Porto Alegre.

Direto da Redação é um fórum de debates, editado pelo jornalista Rui Martins.

Tags:
Edição digital

 

Utilizamos cookies e outras tecnologias. Ao continuar navegando você concorda com nossa política de privacidade.

Concordo